Lá passou mais um Moita Metal Fest e como sempre a SFTD Radio marcou presença... A romaria
de negro tornou-se tradição e metaleiro que se prese não falta. Os cartazes de grande nível relembram-nos que acima
de tudo não faltam grandes bandas no nosso país e o ambiente único é só
por si um ponto a favor e de difícil comparação. O espírito de
camaradagem e comunhão transcende os estigmas que por muito tempo se
perpetuaram : este é um festival que une várias "tribos", que foge dos
elitismos e que serve de exemplo os amantes do DIY (Do It Yourself). Este é um
festival que nos enche de orgulho e mais uma vez fomos obrigados a
sublinhar tamanho sentimento.
Se
na noite anterior os Vader e os Hate tinham enchido o Paradise Garage,
na de sexta-feira o público metaleiro poderia ter ficado dividido entre o
primeiro dia do MMF e a apresentação do novo álbum dos Moonspell no Coliseu dos Recreios. A realidade provou um resultado bem diferente e
que de certa forma contrariou todas as bases da matemática: o público
multiplicou-se e encheu ambos os recintos.
Ficaram
guardados no bolso os discursos de excesso de oferta. Quando há este
nível de qualidade, batalhado anos a fio em ambos os casos, o público
não fica indiferente. Nem S.Pedro ficou e mais uma vez deu o seu contributo e brindou-nos com dois belos dias de Primavera. Estavam reunidas todas as condições para mais uma edição memorável.
Jackie D |
Por volta das 21H entraram
em palco os primeiros músicos dando início ao desfile de nomes de peso
para todos os gostos e feitios.
Coube aos Jackie D a honra de abrir tamanha celebração do que tão bem se vai fazendo pelo mundo da música nacional.
Uma
carta fora do baralho metal mas que no último ano, e a par de outros
exemplos, foi ganhando o seu espaço no circuito nacional com o álbum de
estreia Symphonies of the City.
Depois
de rodarem na estrada ao lado de nomes como Low Torque, sempre dentro
do imaginário do Rock mais musculado, não temeram o público da Moita e
isso certamente se deve à experiência ganha em projectos anteriores.
Numa
altura em que a confirmação dos Grankapo no Hardcore Pool Party poderia
pôr em causa a continuidade deste projecto o quarteto respondeu com
novos temas (não estão incluídos no álbum) em palco. O conhecido
vocalista "Fuck", um ícone do hardcore português, demonstrou, mais uma
vez, que não se deixa limitar ao estigma dos vocalistas de vertentes
mais punk. O homem sabe cantar, gostem ou não, isso já são opiniões e
cada um tem a sua...
Sem
ceder demasiado às tendências Stoner muito em voga actualmente, o seu
rock premiou o público com dinâmicas mais fuzzy e passagens rítmicas
mais groovescas demonstrando que nestes géneros nem sempre uma guitarra
tem de se fazer passar por duas para se destacar. No entanto é nas
linhas de baixo que os Jackie D primem pela diferença criando por vezes
momentos mais funk. Exemplo disso é o single "This City" que arrancou os
primeiros coros da noite. Os detalhes mais característicos de punk
rock, que volta e meia surgem nas suas músicas, serviram de catalisador
de uma incessante movimentação no Mosh Pit que perdurou durante os dois
dias.
Imprevistos de última hora ditaram uma alteração no horário.
Os
Switchtense largaram as mil e uma tarefas implícitas na organização
deste festival e correram para o palco de forma a colmatar a vaga
momentânea deixada pelos Terror Empire.
A jogarem em casa o resultado dificilmente poderia ser negativo. Até à data não fora e ainda não foi desta vez.
Switchtense |
No
mesmo palco onde ficou gravado o seu primeiro e único DVD ao vivo, a
banda de Hugo e companhia atacou os seus êxitos que já fazem parte da
banda sonora destas andanças faz algum tempo. No entanto, foi com dois
novos temas que apresentaram a sua Setlist explosiva. "All or
Nothing" demonstrou toda a pujança que podemos esperar do próximo álbum.
Sem dó seguiu-se "Super Fucking Mainstream" que prime pelo fast-pace bem
característico do Thrash Metal mas com o carimbo próprio da banda. Não
mexeram na fórmula vencedora nem inventaram progressismos
desnecessários. Continuam a primar pela sonoridade "in your face" que só
não conhece quem ainda anda a dormir. Não será por esta via que
alcançarão uma maior base de fãs mas os que já o são assumidamente (e
não são poucos) se sentirão ressarcidos certamente.
Switchtense |
O
resto do concerto fez-se em formato best of. Não faltaram os singles "
Right Track", "Into the Words of Chaos" assim como a poderosa "Face
Off".
Os
primeiros circle-pits da noite comprovaram mais uma vez que,
independentemente dos horários na programação, na Moita estes rapazes
serão sempre cabeças de cartaz. Não o são por mera cortesia e nós como
público compreendemos e aplaudimos.
Não
poderíamos deixar de referenciar o excelente trabalho do novo baterista
Antonio Pintor que se provou ao nível dos seus antecessores. A evolução
desde o Mazefest, por exemplo, é clara. Adicionaram uns tantos kg e
isso fez-se sentir no peso da gravidade. Há que encarar isso como treino
de musculação para o pescoço.
Já
não restam pretextos desnecessários para celebrar o seu estatuto na
cena nacional: são a maior banda do seu género e a melhor das provas
está nas influências claras que provocaram noutros projectos que andam
pela estrada fora. Agora venha lá esse álbum!
Terror Empire |
Na vasta plateia temeu-se por breves momentos que os rapazes de Coimbra não conseguissem picar o ponto nesta edição do MMF.
Tal
não aconteceu e os Terror Empire compensaram tudo com o seu metal cheio
de influências de Thrash mais clássico, a par dos primeiros álbuns de
Sepultura, assim como volta e meia partiam a loiça toda com break-downs
sólidos e paredes de som demolidoras que muita tentativa de death metal
tem dificuldade em atingir...
De
facto, tal como no exemplo anterior, nunca tentaram reinventar a
pólvora e é por aí que foram conseguindo construir, passo a passo, a sua
carreira e que neste momento merecem estar sob as luzes da ribalta
graças ao bem fresquinho "The Empire Strikes Black".
Um claro ataque ao topo das listagens para melhor de 2015 e ainda vamos no primeiro semestre do ano.
Terror Empire |
O
tecnicismo nas linhas e solos de guitarra trazem pormenores a valorizar
no som da banda mas infelizmente na Moita, possivelmente fruto do
conjunto de adversidades que marcaram a sua jornada até chegar ao
recinto, a grande produção presente no álbum ficou apagada perante
alguns problemas de som.
No entanto há vários aspectos que abonam muito a favor da banda.
Primeiro,
quem os tenha visto na sua última passagem pelo mesmo palco e repetido a
experiência na passada sexta-feira terá notado uma clara evolução e
maturidade acrescida. Estão mais confortáveis e isso remete directamente
para o segundo aspecto : os novos temas são a prova de identidade
própria que de certa forma faltava e que certamente orgulha os seus
autores. O conforto de tocar temas com produções assim é certamente
outro.
Com
o devido sound check este seria muito provavelmente a melhor prestação
dos Terror Empire que tenhamos assistido. "The Servant" e "Good Friends
Make the Best Enemies" são alguns exemplos de temas marcantes na sua
passagem pelo Moita Metal Fest.
Não
deixa de ser interessante ver a vaga de bandas neste registo sonoro que
estão a vingar pela Península Ibérica com grandes registos de estúdio e
concertões ao vivo. E no caso dos nuestros hermanos não me refiro
apenas aos nossos já queridos Angelus Apatrida.
Seguiu-se o concerto mais old-school do festival e que ficou a cargo dos bem experientes Iberia.
Iberia |
Em
tempos, não faltavam grandes nomes de Hard Rock a rodarem no mainstream
e no mundo do NWOBHM dissecava-se tudo até ao mais ínfimo pormenor.
Houve espaço até para o Glam Metal tal não fora o entusiasmo...
Muita
da geração mais velha, ainda resistente e presente neste tipo de
eventos / convívios, tem para si a esperança que os anos gloriosos do
metal ( assim como do rock feito para encher arenas ) voltem um dia, nem
que por breves momentos. Vê-se nos seus olhos e ouve-se na sua música.
Os Iberia são uma prova da teimosia da velha guarda e que deve ser
saudada por quem respeita todos os momentos que formam o Metal em todas
as suas vertentes.
Os
coletes de ganga e as botas de biqueira de aço foram tirados do baú e
frente ao palco lá estiveram, mais uma vez. Sem vergonha ou embaraço
perante o público mais jovem que começa agora a dar os primeiros passos e
que se atropela na busca do mais rápido, do mais pesado ou do mais
barulhento...
De
facto, "Hollywood" pode não ter caído no goto do metaleiro mais extremo
mas soube a revivalismo: em tempos a música não tinha vergonha de
entreter nem ninguém se envergonhava de ser entretido.
De
qualquer forma ficou evidente que quem fez a festa foi quem ficou a
ganhar. Provou-se a máxima de que velhos são os trapos e a Sociedade
Filarmónica virou um Estádio Olímpico. Não teve fogo-de-artíficio,
insufláveis nem detalhes espalhafatosos mas teve garra, espírito, alma!
Fez-se jus a aqueles refrões que foram escritos para serem cantados por
multidões.
Respirou-se Rock'n'Roll.
O
vocalista Hugo Soares deu o seu melhor puxando sucessivamente pelo
público com temas mais interactivos como "Fuck the Teacher" mas volta e
meia era Jorge "Slash" Sousa que roubava as atenções com os seus solos de
Les Paul em riste.
Os
Iberia fizeram por merecer o seu lugar cimeiro neste primeiro dia e o
público junto ao palco trocou as movimentações mais violentas pelo
clássico air-guitar. Nos seus rostos esteve espelhado a diversão. A
banda ficou claramente lisonjeada. Um momento bonito de se ver nesta
primeira noite de festival.
More Than a Thousand |
A
fechar a noite os headliners More Than a Thousand, que muito
contribuíram para encher a sala e trazer muitos estreantes, conseguiram
meter a multidão a largar litros de suor e a puxar pelas cordas vocais.
Se
desde cedo o ambiente energético se fez sentir, naquela altura em
concreto os níveis ascenderam. O seu público era claramente mais jovem e
dado a vertentes de som mais modernas. Provavelmente mais
familiarizados com o Metalcore característico do novo milénio, esta
geração pós-Nu-Metal não se deixou intimidar pelos habitués...
More Than a Thousand |
A
moldura humana foi por si só um espetáculo. Os crowd surfers
demonstraram-se em número superior à capacidade de absorção na plateia
mas a banda soube lidar bem com a situação. A sua simpatia para com os
fãs foi clara em todos os momentos.
No
que toca aos aspectos sonoros assistimos ao oposto do que tínhamos
encontrado no Paradise Garage no término do ano passado: o som demasiado
produzido e apontado para um cenário clubbing perdeu parte do seu
impacto naquele contexto de festival. Não é no som mais rasgado que vão
buscar os seus pontos positivos e o espetáculo está montado com
apontamentos semelhantes a prestações de bandas electrónicas. Vasco Ramos é um mestre de cerimónias antes de ser um vocalista e isso faz
toda a diferença na forma como maximizam as suas prestações ao vivo.
Mais
uma vez foram os temas de Vol.4 Make Friends and Enemies ("It's Alive"'
"Roadsick",...) e Vol.5 Lost At Home ( "Heist", "Feed the Caskets",
"Fight Your Demons",...) que marcaram a setlist para claro agrado do
público.
O
espetáculo está claramente estudado do princípio ao fim e momentos como
"We Wrote This Song About You" com Fabio Baptista dos Hills Have Eyes
ou o momento a solo do vocalista em "In Loving Memory" (cujo os acordes
têem escrito Deftones por todo o lado) são prova disso, funcionando na
perfeição.
Dois
momentos que perdurarão na memória dos presentes, entre outros
certamente, são o coro de vozes sentido em "Cross My Heart" e "No Bad
Blood" que fechou a noite em grande nível.
More Than a Thousand |
Não
foi o melhor concerto que já assistimos dos More Than a Thousand mas
mais uma vez foi claro que arrastam multidões, fazem delirar a sua base
de fãs e continuam a adicionar outros tantos a cada passagem. A sua
internacionalização ainda é desconhecida de muito do público português
mas é um facto. Esta é uma das bandas cuja sua singularidade poderia ter
sido um reduzido prazo de validade em Portugal mas que na realidade
ditou a entrada num circuito bem maior. Um exemplo para os mais
ambiciosos. "Sigam os vossos sonhos" - a frase dita em palco deve
perdurar.
Quando as luzes se acenderam tornaram-se visíveis os sorrisos nas faces. O público estava claramente satisfeito.
O
saldo da primeira noite foi claramente positivo mas no dia seguinte
esperava-nos uma maratona de peso diverso. As ressacas e as dores de
corpo teriam de ser adiadas. A casa cheia rondou certamente os records
do festival deixando a fasquia bem alta para a noite seguinte que já se
perspectivava com uma enchente maior... Ao fim de apenas 5 concertos a
edição 2015 já se candidatava a uma das melhores de todo o seu
historial.
MOITA C******!!!
Terror Empire
Switchtense
Iberia
More Than a Thousand
Texto: Tiago Queirós
Fotos: Nuno Santos
Vídeos: Nuno Santos / Tiago Queirós