Devidamente restabelecidos do primeiro dia e prontos para mais uma maratona de seis concertos, voltámos ao LAV-Lisboa ao Vivo, convictos de que esta seria mais uma noite a reter na memória.
Às 18h30m, iniciaram a atuação os Collapse of Light, um projeto luso-finlandês, ainda recente, com o primeiro álbum lançado este ano. Ficámos estáticos a ouvir a vocalista finlandesa, a primeira a subir ao palco, interpretar uma balada, sem acompanhamento dos restantes músicos, e sentimo-nos transportados para outra dimensão, guiados pela voz angelical de Natalie Koskinen.
Pouco depois, entrariam em cena os restantes elementos, incluindo o vocalista masculino. Foi assim que, em A Place to die,pudemos desfrutar do trabalho da banda com todo o seu potencial. Apesar de notarmos alguns problemas no som, que talvez tenham retirado algum brilho à interpretação da voz feminina, não pudemos deixar de apreciar a densidade e peso da atuação, a voz masculina, que muito nos agradou, e a alternância entre momentos em que a lírica que sobressai, quase recitada, e outros momentos, nos quais surge todo o peso da banda. No final, os elementos foram saindo de cena, um a um, restando o guitarrista, com o qual terminou a atuação. Entretanto, o público já tinha acertado a sua pulsação com a toada doom.
Os islandeses Kontinuum foram uma agradável surpresa. Logo aos primeiros acordes, o público foi forçado a acordar do torpor em que tinha mergulhado com a banda anterior. O poder do rock é infalível e trouxe de imediato uma boa dose de vivacidade à sala. As melodias fortes, o ritmo mais acelerado, a energia e expressividade do vocalista desencadearam movimento na assistência.
Destacamos o tema Breathe, que motivou fortes aplausos, dada a fantástica interpretação a que teve direito, carregada de emoção, bem como Two Moons, pela lírica e melodia fortes. A banda terminou a atuação em islandês, com uma excelente reação do público, que os aplaudiu com entusiasmo.
Nunca se está verdadeiramente preparado para ver e ouvir SINISTRO. Já sabemos que é assim desde que ouvimos, pela primeira vez, os temas de Cidade, lançado em 2013,e guardámos na memória a impressão que nos causou. Ao vivo, vimos pouco, pois infelizmente não são frequentes os concertos em Portugal, embora possamos afirmar que são sempre uma experiência inesquecível. Arriscamos dizer, no entanto, que desta vez, ainda conseguiram superar as nossas expectativas, o que já considerávamos difícil.
É verdade que Patrícia Andrade é muito mais do que uma simples vocalista. Nas suas interpretações, há também drama e poesia, acompanhados de uma expressão corporal magnífica, por vezes desconcertante, que nos mantém em constante estado de alerta, porque só ver e ouvir é pouco: é preciso atentar na lírica, relacioná-la com o que nos é dado visualmente, interpretar as projeções dos videoclips e ainda deixar-nos conduzir pelo trabalho brilhante dos músicos.
Talvez por isto, um concerto de SINISTRO possa absorver-nos a energia, e não se destina a um público qualquer. Tivemos o privilégio de ouvir temas incluídos nos vários álbuns, nomeadamente Cosmos Controle, Relíquia, Partida ou Abismo, terminando com Cidade – Parte 2.
Os ingleses Antimatter eram uma das bandas que mais aguardávamos, curiosos que estávamos para ouvir ao vivo temas do novo Black Market Enlightenment. Foi precisamente com o tema The Third Arm que a banda iniciou a atuação, recebida calorosamente pelo público. Mais tarde, seríamos ainda contemplados com Partners in Crime, também do novo álbum, um tema que, na nossa opinião, ganhou em intensidade e peso na atuação ao vivo.
Noutro momento, enquanto a magnífica voz de Mick Moss entoava pela sala na interpretação de Stillborn Empires, concluímos que é frequente sentirmos que a música tem o poder de nos transportar para outra dimensão mas, no caso de Antimatter, há algo mais a dizer. A conjugação da lírica com a voz e com o trabalho brilhante dos músicosocupa-nos, efetivamente, o pensamento, mas não totalmente: deixa um espaço para a reflexão e para nos mantermos conscientes de que há uma mensagem a receber. E Mick Moss, na sua interação frequente com o público, fez questão de nos apontar o dedo, tornando-nos responsáveis por essa mesma mensagem recebida.
Vários foram os momentos a reter, mas não podemos deixar de destacar a interpretação de War, com a participação de Luís Fazendeiro (Painted Black), parceiro de Mick Moss no projeto Sleeping Pulse, como uma das interpretações mais fortes desta noite.
Com a entrada dos suecos Shining, o público viu-se forçado a emergir do estado melancólico em que mergulhara. Aliás, o vocalista Niklas Kvarforth fez bem o trabalho de agitar a assistência, rompendo pelo palco de garrafa na mão, a cuspir Jack Daniel’s e reclamações relativas à qualidade do som, entretanto atendidas pelos técnicos.
Assistimos a uma atuação agressiva, irreverente, quase inteiramente em sueco, e com forte adesão do público, frequentemente interpelado pelo vocalista. Terminaram mais calmamente, com o tema For the God Below, no qual são dominantes a depressão, a descrença e o gosto pela atmosfera negra e sinistra. O público, totalmente rendido à agressividade da banda, não poupou nos aplausos.
E chegámos à última atuação, provavelmente a mais aguardada da noite. Os islandeses Sólstafir fizeram as delícias dos fãs, apresentando-se enérgicos, cheios de simpatia e boa disposição, sendo o vocalista Adalbjörn Tryggvason um frontman de excelência que nem precisa de falar muito, dada a sua expressividade, as constantes deslocações em palco e a capacidade de olhar para a assistência, quase individualmente.
Todos nos sentimos implicados na atuação e, por isso mesmo, todos os temas foram devidamente acompanhados pelo público com palmas, gritos de entusiasmo e forte agitação na sala.
Como momentos fortes, destacamos a interpretação de Ísafold, Silfur-Refur, Fjara (pedida pelo público) e Blafjall, entre muitos outros. Este último ganha relevo pela sua mensagem, explicada por Adalbjörn Tryggvason à assistência, já que é dedicada a quem sofre de depressão ou de adições e que tem de suportar um árduo caminho para vencer essa batalha.
O final da atuação, com Goddess of the Ages, foi bastante emotivo, com o vocalista a caminhar sobre a grade do pit dos fotógrafos e a pedir o apoio de várias mãos que de imediato se estenderam para ajudá-lo. Fica a mensagem da necessidade de entreajuda e de união entre as pessoas para a superação de qualquer dificuldade.
E foi com esta brilhante atuação que encerrou o Under the Doom VI, naquela que foi, para nós, a melhor edição a que tivemos o privilégio de assistir até hoje.
Felicitamos a Notredame Productions pelo trabalho desenvolvido e desejamos muitas e boas edições deste festival, que é já uma referência.
Texto: Sónia Sanches ( SFTD Radio )
Fotos: Hélio Cristóvao (WOM)
Agradecimentos: Notredame Productions