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18/12/2019

[Resumo] Under The Doom 2019 (com vídeos)



Apesar de este ano não termos efectuado "oficialmente" a reportagem do evento, o Tiago Silva, nosso autor do programa Black Sunshine, que abrange as sonoridades mais negras e doomescas, não quis deixar em branco tal evento, e deixou-nos aqui a sua visão dos acontecimentos.

Agradecemos também a amabilidade da Joana Cardoso, que nos cedeu algumas fotos, que poderão encontrar originalmente na foto-report da Arte Sonora (links abaixo)

Dia 0 – Warm up day - RCA em Alvalade - 6 de dezembro


O primeiro dia do Festival Under the Doom começou sexta-feira dia 6 de Dezembro, por volta das 19h30 com os Portugueses Dogma. Com o seu rock metal gótico intercalado por uma voz masculina, que lembraria o vocalista de Mão Morta e a voz feminina contrastante em canto lírico. Seguiu-se Wildnorthe com raizes distintas, electrónicas, a experimentar ambientes darkwave, ambas a representar o nosso underground mais “negro”.

Seguiu-se Total Death vindos do longínquo Equador, rompendo o véu negro com o seu death doom avangard com tantas outras influências desde Thrash a também Black Metal, numa mistura avassaladora que acordou com peso uma plateia já mais composta no RCA em Alvalade.
Tivemos ainda a oportunidade de ver Outshine, vindos da Suécia, satisfazendo aqueles fãs do rock metal mais gótico, onde as guitarras lembravam bandas como 69 Eyes e cujo vocalista era com certeza um discípulo de Nick Holmes e Peter Steele. A banda ficou certamente agradecida a Dogma que gentilmente cederam o seu backline uma vez que todo o equipamento da banda ficou retido no aeroporto.

Para fechar a noite, por volta das 23h30 os portugueses Nighttime Birds, banda tributo aos pioneiros The Gathering subiram ao palco. A banda mostrou-se bem instruída, recheada de membros com vasta experiência e com a lição bem estudada. 

Respeitaram os tempos das canções, cada nota estava no sítio, desde as guitarras, teclado até à voz. Porem, é sempre difícil atingir o nível de emoção e entrega que The Gathering tem ao vivo, em especial na sua época de ouro, com a vocalista Anneke Van Giersbergen que sorri a cada entoação e demonstra aquela doçura enquanto gentilmente nos emociona. Apesar das músicas terem sido muito bem estudadas, faltou talvez o factor à-vontade que iria permitir essa entrega, essa emoção.

Dia 1 - RCA em Alvalade - 7 de Dezembro

O primeiro dia forte do Festival Under The Doom começou sábado por volta das 18h30. Dia marcado pelo cancelamento de SAOR devido à greve que se fez sentir em França, banda esta que iria servir ironicamente de substituta a Solstice, e que acabou por não conseguir mesmo comparecer para pena de alguns. Foi anunciado pela organização que as restantes bandas iriam ter mais tempo de actuação, de forma a preencher este vazio.

Fomos brindados pelos Petrichor do Reino Unido, cuja sonoridade doom/death nos remeteu em algumas partes para os reis My Dying Bride, o que é sempre óptimo. Consecration, também vindos do UK, com uma abordagem mais sinistra mas igualmente melódicos e dissonantes.

A supresa do dia viria mesmo de terras lusas com o trio Wells Valley, imaginem que Gojira decidia fazer um álbum de black/doom e juntava alguns ingredientes hipnóticos e obscuros, seria este o original resultado. É de louvar os ambientes gerados, tanto fortes como melódicos com o precioso auxílio de um loop pedal, adicionando camadas de interesse e psicadelismo para depois sermos arrebatados por uma imensa força perturbante que nos preenchia a cada nota.

Para a expectativa de muitos, inclusive a nossa, Daylight Dies ocupava aqui um lugar de destaque neste festival, porém talvez por falta de engrenagem ou pela força demolidora da banda anterior, ficou um pouco aquém das expectativas. Alguns temas emblemáticos foram deixados de fora, apesar da boa forma do vocalista principal e alguns membros, a coesão não foi total. Ficaram também a faltar mais daquelas músicas com voz limpa para intercalar com o gutural, um pouco como Opeth nos ensinou e bem, que a banda lançou à cerca de 10 anos.

O que dizer acerca de Alcest? A banda cabeça de cartaz de sábado foi a mais coesa e marcante. O génio Neige, principal compositor, demonstrou a um RCA à pinha, o porquê de ser especial. Uma soberba mesclagem entre Shoegaze e Black metal (que teve origem em Alcest o genéro Blackgaze como tantos sabem, aqui exemplificado). 

As guitarras étereas cheias de reverb e as explosões em blastbeats e pedal duplo com muito overdrive estiveram em perfeita simbiose. As passagens entre partes era feita sem qualquer esforço e com suavidade. O som em si, foi igual ou mesmo melhor do que algumas das misturas ouvidas nos seus álbuns, a perfeição foi praticamente idêntica. O que só demostra a boa forma dos franceses, onde não faltaram temas do mais recente álbum, Spiritual Instinct. 
O concerto porém, foi curto. 60 minutos com uma plateia a pedir um encore em plenos pulmões, após um final magistral em Délivrance que por algum motivo inerente à banda, ficou por ali. Esperemos que voltem e que nos levem para aquele outro mundo deles por mais algum tempo.

Dia 2 - LAV - 8 de Dezembro

O último dia do Festival Under the Doom começou domingo, ainda mais cedo do que nos dias anteriores e arrancou em força com Pântano. Os portugueses liderados por Nuno Rodrigues, que enquanto frontman deu tudo que havia para dar, lembrando uns Alice in Chains cruzados com Ornatos Violeta.



Heavenwood, banda portuense que dispensa apresentações, que tem tudo para competir com as melhores bandas lá fora, teve desta vez na bateria o multi-instrumentista e produtor Daniel Cardoso, com uma setlist que abrangeu alguns dos seus melhores e mais recentes êxitos. Para alguns, o melhor concerto da noite.


Darkher distinguiu-se pela sua diferença e captivante simplicidade, ao estilo que uma Chelsea Wolfe nos habituou. Jayn Maiven juntamente com apenas o seu baterista, levaram-nos numa assombrosa viagem que em parte chocou, e ainda bem, com as restantes bandas num formato menos comum. É certamente bom haver surpresas destas e artistas dispostos a arriscar e a experimentar, que não se encaixem nas comuns fórmulas e estereótipos e que tanto ganham com isso.



Seguiu-se Ardours com a vocalista Mariangela Demurtas, que certamente conhecem devido à banda norueguesa de gothic metal Tristania e também porque além de italiana é cada vez mais portuguesa, pelas razões óbvias. Uma formula épica de rock gótico alternativo, que contou também com a participação de Daniel Cardoso, que teve pela primeira vez num dia só um concerto duplo, mas pelo menos teve uma banda de intervalo entre actuações, uma proeza só mesmo para os mais capazes.



Disillusion, outra banda que supreendeu bastante, com uma enorme energia ao vivo, também da editora alemã Prophecy Productions, que tantos tesouros partilharam connosco ao longo dos seus anos de existência. Um cruzamento entre o metal mais contemporâneo e traços mais tradicionais de metal gótico e alternativo. Talvez a voz barítono do vocalista estivesse um pouco baixa demais, mas competir com três guitarras em palco, seria sempre difícil e complicado de orquestrar em harmonia, como se pode ouvir em álbum.




E eis que Paradise Lost fecharam a noite com chave de ouro. Durante a sua actuação de 90 minutos não faltaram os temas mais emblemáticos da sua carreira: Enchantment, Hallowed Land e As I die. Como também músicas do mais recente álbum Medusa. Porém, em comparação com as anteriores setlists em anos anteriores em que passaram por Portugal poderia ter havido mais variedade, nomeadamente temas retirados de álbuns do inicio do ano 2000.


Durante esta actuação, mal nos conseguiamos mexer, mas nem por isso estivemos menos entusiasmados com os mestres do rock/doom gótico inglês, pioneiros nestes estilos que derivado do seu aparecimento no século anterior tantas bandas influenciaram. Em temas mais pesados, notamos que o gutural de Nick Holmes ficou de fora, sem perceber bem porquê. Contudo a banda fez mais do que o expectável e ao contrário de Alcest, voltou para encore com No Hope in Sight e o emblemático Say Just Words.


Para concluir, esta foi certamente a melhor edição do festival até à data, a que mais pessoas levou no passado fim de semana ao RCA e LAV, desde que a Notredame Productions teve a óptima ideia de criar este evento. O Doom/Dark Metal e seus derivados está vivo, de boa saúde e recomenda-se.





Texto: Tiago Silva
Fotos: Joana Cardoso / Arte Sonora - Todas as fotos nas galerias originais: DIA 1 | DIA 2
Vídeos: Patricia Amorim / SFTD Radio