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11/12/2018

[Report] HELLOWEEN: Pumpkins United Tour em Lisboa


Lendas da música pesada, pioneiros do Power Metal e ícones do Speed Metal Melódico dos anos 80, em finais de 2018, os Helloween são também fortes candidatos a concerto do ano no nosso país.

Na passada noite de quinta-feira, a Sala Tejo recebeu a Pumpkins United Tour e tamanha reunião foi recebida com proporcional recepção.
O público português recebeu os históricos alemães de braços abertos e encheu a sala do Parque das Nações, muito próxima de esgotar, sendo que mesmo antes da abertura de portas a fila no exterior se demonstrava superior a muitos eventos de envergadura semelhante.


Em 2016 rumámos a Vagos, na primeira edição enquanto Metal Fest, e assistimos a um belíssimo concerto com a sensação que aquele palco castrou não só a produção como a performance da banda.


Tal não se repetiu. Naturalmente, também nessa altura o debate Michael Kiske vs Andy Deris veio à baila. O primeiro, eternamente associado aos Keepers of the Seven Keys: Part I e II, cimentou-se na memória dos portugueses aquando da estreia da banda de Hamburgo no saudoso Dramático de Cascais (a abrir para Iron Maiden) no distante ano de 1988.
Esta vantagem é ainda clara 30 anos depois, não fosse também o seu público evidentemente fruto dessa geração e residualmente das posteriores. Já o segundo sofre das reservas quanto a novos vocalistas, uma constante na história da música à qual não é excepção.


No entanto, Andy Deris tem 25 anos de Helloween e mais de uma dezena de álbuns com a banda sendo que exemplos como Master of the Rings e The Time of The Oath (os seus dois primeiros neste colectivo) são ainda hoje citados como dos favoritos dos fãs.

Esta dicotomia foi ficando cada vez mais dissolvida com o passar do tempo e o discurso da facção fidelizada a Kiske soa já aos discursos de Velho do Restelo. Derris sobreviveu com mérito e qualidade sendo que qualquer fã de Helloween que tenha quebrado as correntes da nostalgia aceita que há um antes e um depois e que ambos os capítulos merecem ser aplaudidos.


Claro que ainda existem aqueles que drasticamente cortaram relações com a banda desde a saída do seu fundador, Kai Hansen, reconhecido como dos melhores guitarristas de seu género e que também ele deu a voz no primeiro capítulo discográfico da banda.

Estes então, numa grande maioria, nem chegaram a entrar na década de 90... Pumpkins United é a melhor resposta possível a toda esta fragmentação de uma banda que outrora fora das maiores do universo da música pesada mas que cujo seu legado já nem alcança a grande fatia do público metaleiro das faixas etárias seguintes, impossibilitando a renovação do seu público. Algo que Iron Maiden consegue como ninguém. 


Esta reunião, para não confundir, junta a formação de 2016, com as pedras basilares Michael Weikath (guitarrista desde 1984) e Markus Grosskopf (baixista desde 1984), o já citado Derris (vocalista desde 1994) e os "rookies" de início do milénio Daniel Löble (baterista desde 2005) e Sasha Gerstner (guitarrista desde 2002, que roubou muitas das atenções em Vagos) ao fundador Kai Hansen (guitarrista 1984-89 e vocalista em Walls of Jericho) e Michale Kiske (vocalista 1986-93).


Ora este cocktail até pode ser ligeiramente confuso para os menos familiarizados com a história da banda mas é exactamente isso que os (re)transportou para debaixo dos holofotes mediáticos, reunindo todas as suas "facções" e ainda despertou a curiosidade dos mais novos.

Conseguiriam materializar toda a teoria de três guitarras e duplas vocais num espectáculo verdadeiramente memorável? Era essa a nossa questão que buscámos resposta no concerto em Lisboa.


"Let Me Entertain You" rompeu a playlist que dava som ao compasso de espera da multidão frente ao palco. As palavras de Robbie Williams soaram a gentil cortesia pois o pedido fora mera formalidade. 
O tiro de partida foi feito com a extensa "Halloween", que não falhou em arrancar os primeiros coros da noite. É certo que nada comparável ao Live on 3 Continents, mas para quem tinha feito o aquecimento à base de cerveja a 3€ e sem banda de abertura não esteve nada mau.


Já a boa disposição do tema "Dr.Stein", outro dos clássicos da banda, obteve um dos melhores sing-along da noite com o público a soltar-se de vez e a levantar os pés do chão deixando se levar pela dimensão do espectáculo que tinham pela frente. 

A dupla de vocalistas desde o primeiro momento demonstrou pura simbiose. A individualidade de cada não é novidade mas juntos não debitaram letras à vez, foram muito mais além: o ponto de encontro de timbres e tons demonstrou-se perfeito, sem se denotar quebras ou falhas em quase três horas a puxar as cordas vocais ao máximo.

Ao contrário de algumas queixas, sentimos que o som da Sala Tejo esteve como desejaríamos que tivesse estado noutros concertos: poderoso sem soar ruidoso, coeso e demolidor sem por em causa o high pitch dos vocais.


"I'm Alive", que se temia não entrar na setlist, foi protagonizado por Kiske que voltaria a tomar as rédeas com "Livin' Ain't No Crime" e "A Little Time". A setlist foi jogada pelo seguro, como se pedia, num formato Best Of que obviamente deu um foco especial aos trabalhos de estúdio dos anos 80 mas também passando por álbuns como os tais dois primeiros de Kiske, já citados, assim como Straight Out of Hell, 7 Sinners e The Dark Ride. Deste último, a balada 2000's rock fm "If I Could Fly" abrandou o ritmo da banda, outrora conhecida como Maiden em speeds, mas voltaria a retomá-lo com a interação de "Are You Metal?".  Deris a tomar conta dos temas do seu "capítulo". 


Kai Hansen brilhou com um belíssimo medley de Walls of Jericho num dos momentos mais pesados da noite com as alucinantes "Starlight", "Ride the Sky", "Judas" e "Heavy Metal (is the Law)" a reunir todo o quarteto de cordas lado a lado num trabalho de equipa que espelha toda a história da banda num só frame. A voz mais rasgada, menos polida e trabalhada encaixa naquele álbum de forma perfeita e soube bem poder assistir aquele momento ao vivo. 

Ver o Homem dos Gamma Ray a voltar aos Helloween é certamente algo de muito agrado dos fãs mais old-school e em palco percebeu-se o porquê. O constante sorriso nos lábios do mesmo deixa a ideia que não seria só o publico a desfrutar.

 O alto nível não baixou um milímetro. "A Tale That Wasn't Right" juntou umas tantas centenas de vocalistas na plateia que roubaram a vocalização da música num momento épico e que somente nos grandes concertos assistimos.


Celebrou-se esta união em "Pumpkins United" que, golpe de marketing ou não, estava a demonstrar-se produtiva com a banda a ter a plateia na mão. Relembrou-se Ingo, num momento singular:  enquanto solava Daniel Löble nas baquetas, na tela, surgia um registo em video, tirado do baú de memórias, com o falecido baterista a tocar em simultâneo. Homenagem arrepiante e emotiva.

Na mesma tela a iconografia da banda fora uma constante, adicionando pormenores visuais importantes à cenografia em palco. Nela também fomos assistindo a animações da reguila abóbora que serve de mascote dos alemães. Mas como o melhor normalmente fica para o fim nós apenas perguntamos: qual deles?


"How Many Tears" foi apresentada como a primeira música que Deris tenha escutado da banda à qual dá voz nas últimas décadas. Perfeita, foi como a definiu. Do primeiro encore saiu o melhor momento da noite com a contagiante "Eagle Fly Free" seguida da jornada épica de "Keeper of the Seven Keys". 

Sem surpresa mas com confettis e balões gigantes, a despedida em apoteose foi feita de "Future World" e "I Want Out".

E se optimisticamente a maioria esperava um bom concerto, realisticamente assistiram a um dos melhores do ano. O mesmo que nos trouxe Ozzy Osbourne, Iron Maiden, Judas Priest, Kiss e outros tantos...


Quem criou anticorpos face a este tipo de metal, entusiasta, dado a alguns exageros, fundado no metal clássico e extravagante nos vocais, na Sala Tejo talvez não mudasse de opinião. No entanto iria bater o pé, ficar de sorriso nos lábios e desejar saber aquelas letras todas porque os que sabiam divertiram-se como poucos concertos de metal extremo o permitem. 

Com uma formação destas é difícil imaginar a "normalidade". Esperemos que isto sim, seja irrevogável.



Texto: Tiago Queirós
Fotos: Joana Marçal Carriço (todas as fotos brevemente na nossa página no facebook AQUI)
Agradecimentos: RockNRock