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17/03/2017

[Report] Korn, Heaven Shall Burn e Hellyeah no Campo Pequeno: candidato a concerto do ano?


Os Korn regressaram ao nosso país e reclamaram o que era deles por direito e que lhes tinha fugido no verão passado, no Rock in Rio Lisboa: a coroa de reis do Nu-metal em Portugal. 
A conquista foi clara e em força, num dos melhores concertos que deles possamos guardar na memória. Para tal, muito contribuiu uma setlist incrível e um público frenético do início ao fim.

Já passaram mais de duas décadas desde que escreveram a primeira página de um capítulo na história da música pesada, que tem tanto de único como de controverso, e ao vivo continuam a provar que nunca foi uma questão de técnica mas uma questão de ritmo e atitude.
Em estúdio, também comprovaram com The Serenity of Suffering que estão de volta aos "good old days". A banda californiana vive um bom momento e isso é inegável. Por cá o público respondeu em peso e o resultado foi mais do que positivo: este é já um sério candidato a concerto do ano.

No Campo Pequeno, como o ambiente no parque da Bela Vista já tinha indicado anteriormente, comprovámos que os Korn são o melhor caso de sobrevivência ao teste do tempo de um Nu-Metal moribundo e de poucos exemplos que perdurem de forma significante ao nível do que outrora foram, ao criar pontes entre a música pesada e o mainstream mediático.

Os anos passaram e o trigo foi sendo separado do joio com diversas bandas a sumirem por completo e a provarem as teses de que haveria um aproveitamento desmesurado da indústria em dissecar tudo até ao limite.


Dos poucos sobreviventes que possamos enumerar virão à cabeça uns Slipknot amolecidos e cada vez menos distintos do projecto paralelo dos Stone Sour; uns Limp Bizkit adormecidos e actualmente irrelevantes; uns Linkin Park vendidos à pressão dos números e distantes das suas raízes musicais...
Até mesmo os Deftones tem vindo a distanciar-se do carimbo e tentando cimentar a ideia de banda de culto com uma abordagem mais alternativa e artística, definindo uma sonoridade própria.

No entanto, Korn é um caso particular e, numa altura em que os seus devaneios (ou liberdade criativa) parecem ter terminado, não há como recusar os níveis de adrenalina que aquele peso de afinação alternativa e groove contagiante proporcionam.

Naquela arena, graças a Jonathan Davis e companhia, pudemos ignorar o declínio do género e, na altura de saudar o que hoje já podemos definir como clássicos, ninguém demonstrou um pingo de timidez.

Eles foram aparecendo, uns atrás dos outros, para gáudio da multidão que se apresentou em peso com diversos sectores da arena esgotados.

Ainda antes dos concertos que marcaram esta noite de quarta-feira, a SFTD Radio teve oportunidade de mostrar em directo para os nossos ouvintes e seguidores o ambiente entusiasta e expectante que se ia instalando em redor do recinto.


Especial Korn: EM DIRECTO do Campo Pequeno
Publicado por SFTD Radio em Quarta-feira, 15 de Março de 2017


A multidão, que circundava em fila indiana um recinto ainda por abrir, antecipava uma noite especial.


A seguir aos Moonspell que celebraram a sua bela carreira com uma grande produção dividida em três actos, esta tour era unanimemente considerada como o maior evento à data neste 2017 rico em fartura e qualidade.

Por volta das 20h, subiram ao palco os norte-americanos Hellyeah para darem início a um concerto que já se antecipava curto mas que dificilmente reuniria tamanha multidão se fosse por meios próprios.

A banda não regista reconhecimento assinalável entre o povo português, fixado muito na ideia de este ser um super-grupo liderado pelo baterista Vinnie Paul, ex-baterista dos incontornáveis Pantera e irmão do mítico guitarrista Dimebag Darrell (que viu ser assassinado durante o derradeiro show dos Damageplan). 


Sabem também que estão relacionados com o término dos Mudvayne. Banda dos tempos áureos do género em destaque nesta noite, cujo vocalista (Chad Gray) dá hoje a voz pelo colectivo a cargo do tiro de partida. De resto? Pouco mais...

Esta fora então uma boa oportunidade para os Hellyeah desbravarem terreno lusitano e conquistarem uma fan base que simplesmente não fora apresentada de forma eficaz a uma discografia que conta já com cinco álbuns e dez anos de história.

Já com bastante gente pela frente, focaram-se em apresentar temas dos dois últimos álbuns, Blood for Blood (2014) e do fresquinho Unden!able (2016) numa performance enérgica que fundiu bem a ideia de instrumentalizar um metal groovesco com um mestre de cerimónias que sabe como captar as atenções da multidão presente. 

Nos seis temas que tiveram oportunidade de tocar, terão certamente conseguido ganhar novos fãs e desafiar todos aqueles que lhes resumem a um pomposo press-release com os curriculums individuais de cada elemento da banda.

A cover de Phil Collins "I Don't Care Anymore", com arranjos criados por Dimebag já nos Damageplan, deu um toque mais emotivo a um concerto do mais puro Metal entertainment - especialidade norte-americana.


Seguiram-se os alemães Heaven Shall Burn, dos quais ainda guardamos memórias frescas da sua última passagem por Portugal no Vagos Open Air 2015.

São um dos maiores furacões do metalcore ao vivo e, mais uma vez, comprovámos isso mesmo. 
A resposta do público a temas como logo à partida "Hunters Will be Hunted" e "Voice of the Voiceless" com direito a um imponente wall of death, comprova bem que a banda está a viver o seu auge no nosso país.

Estes rapazes tardaram em romper por cá, pelo menos na forma como já o fizeram faz anos por essa Europa fora, mas agora, ao que parece, podemos já falar de paixão mútua.

O ambiente caótico vivido na plateia demonstrou bem que o seu som é um catalizador de massas. Os touros foram soltos na mítica arena lisboeta.



"Endzeit", sem surpresa, marcou o melhor momento da sua actuação com um coro de vozes que se fez ouvir bem entre breakdowns.
Bandas de abertura assim fazem valer bilhetes que implicam algum esforço financeiro ao público que não quer deixar de estar presente em eventos desta magnitude.

Chegou a hora. O público requisita um espectáculo em nome próprio. As provas são evidentes e nem o som abafado, nem um certo penalty que lá pelo meio fez soltar algumas gargalhadas (de quem já recorda os eventos no RIR16 com algum humor), foram suficientes para denegrir esta prestação.

Passando poucos minutos das 22h, a cortina que escondia o backline do headliner da noite ilumina-se aos primeiros sons de bateria. 



A visão de casa (bem) cheia e o clima de expectativa fizeram disparar os níveis de adrenalina: "Right Now" foi o tiro de partida de um espetáculo que tanto se passou em palco como na plateia que não ficou atrás do que possamos encontrar em diversos DVDs gravados na América Latina.
Salvo erro, tanto em 2008 no Pavilhão Atlântico a quando da sua última passagem a 100% por terras lusas, como em 2004 no SBSR (possivelmente a melhor das 9 passagens pelo nosso país) este tema foi servido como entrada de um banquete... e assim foi mais uma vez!

Segui-se uma "Here to Stay", demolidora e certamente claustrofóbica para quem se encontrasse junto à barreira de segurança.
"Rotting in Vain", fosse ele um tema desconhecido para algum dos presentes então facilmente passaria por um tesourinho tirado dos tempos áureos da banda. 
Testemunhamos que o refrão está na ponta da língua e que este álbum poderia até ter sido melhor apresentado sem contestação. Tal não aconteceu e apenas "Insane" fora adicionada a uma setlist que primou por um formato descaradamente greatest hits e que ignorou por completo um passado mais recente. 

Head e Munky, a cargo dos riffs da banda, continuam iguais a si próprios com a sua irreverência plena de classe. Infelizmente, fora um certo desafio contornar o forte jogo de luz que incidia exactamente onde ambos se encontravam, mas são ossos do ofício que pouco ou nada afectam. 
Já na retaguarda Fieldy (baixista), Luzier (bateria) e Zac Baird (teclas) estiveram bem visíveis na lavoura de todo o groove e musicalidade que define a banda.

Seguiram-se coros atrás de coros, desde "Somebody Someone" à cover dos Cameo, "Word Up", que integrou a compilação de maior sucesso da banda há mais de dez anos atrás, passando também por "Coming Undone" com um breve trecho do hino de estádio "We Will Rock You",da banda de Freddy Mercury.

Tudo corria lindamente e, já com o público na mão, o mítico vocalista dirigiu-se aos seus fãs de forma mais alargada justificando os infelizes acontecimentos que ditaram um concerto longe do expectável no Rock in Rio. 


Korn um pedido de desculpa @ Campo Pequeno
Publicado por António Freitas em Quarta-feira, 15 de Março de 2017
Fizeram-se ouvir apupos a esse festival que nunca entrou realmente no coração metálico.

Eles viajam pelo mundo e citando o próprio: "shit happens"... mas nada como espetar o dedo do meio e berrar um "fuck that shit" ao som de "Y'All Wanna Single". Há um certo efeito anestésico nesta acção em particular... Yoga? Experimentem começar o dia a mandar alguém para o c...Conde Redondo! 

Mais uma passagem por Issues, desta vez com "Make Me Bad", talvez o momento mais sucedâneo da noite. Uma "Thoughtless" poderia muito bem ter servido perfeitamente mas não sendo um dos registos mais óbvios não deixa de ser um single.

Se o nível estava alto a recta final excedeu.


A sempre simbólica "Shoots and Ladders" com a gaita-de-foles a justificar a eterna indumentária do vocalista (falo obviamente o famoso kilt) terminou em grande estilo com o previsível "outro" do hino maior de ...And Justice for All, "One" dando lugar ao único solo da noite.

Ray Luzier testou os limites da sua bateria que ficou mais do que aquecida para o momento mais anárquico de toda a noite.

"Are You Ready?" é sempre uma pergunta com rasteira... 

...não, nunca se está preparado para a explosão que "Blind" provoca se tocada ao vivo. É isso que nos apaixona desde os tempos do velhinho álbum homónimo que a SFTD teve oportunidade de ver tocado na íntegra em 2015 no Resurrection Fest.
As imagens falam por si...


Todavia "Good God" esteve bem perto de igualar o feito com o Wall of Death da noite:

Um curto encore da praxe deu lugar às duas pérolas que nunca poderiam faltar.
Primeiro, "Falling Away From Me" fez fazer valer o elogio de "best crowd so far" com  o público a cantar em uníssono a sequência de notas que faz deste um dos maiores clássicos de toda a carreira dos Korn. Momento de clara consagração. 
Segundo, "Freak on a Leash", naturalmente decorada por grande maioria dos presentes, serviu-se numa despedida que fora aplaudida de pé e com toda a legitimidade.


Os Korn redimiram-se por completo de um concerto infortunado em Maio para retornarem nesta segunda-mão de forma histórica e digna de registo. 

Uma reviravolta de contornos memoráveis. Deram tudo e foram retribuídos com um dos melhores exemplos de público português.
Touradas assim valem a pena!
Lisbon 2017
Amazing show last night in Lisbon. We love you, Portugal!
Publicado por Korn em Quinta-feira, 16 de Março de 2017
Texto: Tiago Queirós
Fotos: Joana M. Carriço (todas as fotos no nosso facebook)
Agradecimentos: Everything Is New

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